sábado, 18 de junho de 2011

ILEGALIDADE DO ARTIGO 1228 DO CÓDIGO CIVIL EM FACE DO INSTITUTO DA NOMEAÇÃO À AUTORIA

A ideia principal deste artigo é discutir se o proprietário tem ou não o direito de demandar face o detentor do bem, levando em consideração o instituto da nomeação à autoria.
Preceitua o artigo 1228 do Novo Código Civil:
“Art. 1.228. O proprietário tem a faculdade de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder de quem quer que injustamente a possua ou detenha.”
Primeiramente, acho necessário definirmos as figuras de proprietário, possuidor e detentor.
A definição de proprietário está no próprio artigo em comento. Quem, sobre o bem, tiver a capacidade de exercer os poderes de usar, gozar, dispor e reaver será considerado proprietário.
Já a definição de possuir encontra-se descrita no artigo 1196 do Código Civil:
“Art. 1.196 Considera-se possuidor todo aquele que tem de fato o exercício, pleno ou não, de algum dos poderes inerentes à propriedade."
A melhor definição para detentor que encontrei é a seguinte: “detentor é o possuidor juridicamente desqualificado”, ou seja, é um indivíduo que, apesar de se enquadrar perfeitamente na definição de possuidor, não o será por expressa previsão legal.
A lei prevê quatro situações de detenção. A primeira está descrita no artigo 1198 do Código Civil:
“Art. 1.198. Considera-se detentor aquele que, achando-se em relação de dependência para com outro, conserva a posse em nome deste e em cumprimento de ordens ou instruções suas.” Essa é a definição de servidor da posse ou, o nome jurídico mais usual, “fâmulo da posse”.
Outros dois casos estão previstos no artigo 1208 do Código Civil:
“Art. 1.208. Não induzem posse os atos de mera permissão ou tolerância assim como não autorizam a sua aquisição os atos violentos, ou clandestinos, senão depois de cessar a violência ou a clandestinidade.”
E o último caso é a ocupação de bens insuscetíveis de posse, em regra, bens públicos.
Agora, vamos analisar o instituto da nomeação à autoria. O artigo 62 do Código de Processo Civil esclarece:
“Art. 62. Aquele que detiver a coisa em nome alheio, sendo-lhe demandada em nome próprio, deverá nomear à autoria o proprietário ou o possuidor.”
Percebe-se claramente que na nomeação à autoria existe a presença de três figuras distintas: um terceiro que é o autor da demanda, o detentor como demandado original e figurando ilegitimamente no polo passivo da demanda, e o proprietário (ou possuidor) que deverá ser nomeado pelo detentor.
Veja que só caberá a nomeação à autoria quando o detentor for parte ilegítima da demanda e que, nesse caso, o proprietário necessariamente figurará no polo passivo.
Porém, em alguns casos, o detentor será sim parte passiva legítima da demanda, e o proprietário, nestes casos, será a parte ativa.
Vejamos um exemplo concreto, um indivíduo, proprietário de um bem imóvel, é esbulhado mediante violência. A lei garante ao proprietário reaver a posse perdida através de uma ação possessória, no caso, ação de reintegração de posse. Hora, contra quem será a demanda? No meu exemplo, contra aquele que o esbulhou, que é, por força do artigo 1208 do Código Civil detentor do bem e não possuidor (ato violento não induz posse).
Percebe-se que, neste caso, existe somente a presença de duas figuras: o proprietário como autor da ação e o detentor no polo passivo da demanda. É um caso em que não cabe nomeação à autoria, apesar do detentor figurar no polo passivo da demanda, simplesmente porque o mesmo não é parte ilegítima e sim, visivelmente, legítima.
Concluindo, em minha opinião, o artigo 1228 do Novo Código Civil não fere o instituto da nomeação à autoria prevista no artigo 62 do Código de Processo Civil. Temos que analisar o caso concreto, para definir se aquela detenção é justa ou não. As situações em que cabe nomeação à autoria são distintas das situações em que o proprietário terá o direito de demandar contra o detentor.

Um comentário:

  1. Inicialmente cumprimento o articulista pelo seu brilhante raciocínio jurídico. Concordo plenamente que a chamada “tensa”, ou seja, estado de detenção oriunda da permanência do conflito entre o antigo possuidor e aquele que adentrou no imóvel sob a égide dos vícios objetivos da posse, clandestinidade, precariedade e violência, torna inevitável que se direcione o interdito possessório em face do detentor, pois este diante do antigo possuidor ainda não possui, mas, apenas, detêm, demonstrando o acerto da conclusão apresentada. Não obstante, parece-me que se pode ressalvar o exemplo em relação a aquele que se encontra em bem publico, haja vista que, quanto a posse ad interdicta, isto é, quanto ao direito de manejar os interditos possessórios, o mesmo será considerado possuidor em face do Estado, malgrado, quanto a posse ad uso capionem, tenha que ser necessariamente considerado mero detentor insuscetível de usucapir. Aliás, interessante perceber que mesmo aquele que se encontra em estado de “tensa” poderá manejar os interditos possessórios em face de terceiro que lhe ameace na posse, já que, neste caso, em face de terceiro, será possuidor e não mero detentor. Tal fato demonstra que os limites entre detenção e posse não são tão precisos quanto açodadamente possa parecer.
    Um grande abraço!
    Att: LUIZ

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